terça-feira, 18 de outubro de 2011

No cash, pin only!


Fui comer numa padaria transadinha de Amsterdam antes de ir embora na segunda-feira. Um sanduba de gouda com mostarda e pão de campanha (ótimo!), uma limonada caseira com menta (delícia!) e dois pacotinhos de biscoito de queijo de presente pros irmãos. No caixa o atendente sorri diante do papel moeda: "Não aceitamos dinheiro, apenas cartão".

Cuma?

A explicação é boa: "Por motivos de segurança e higiene".

Mas não deixa de ser mais uma prova do começo da era dos Jetsons.

Comer: Vlaamschbrrodhuys (Vijzelstraat 109, Amsterdam / + 31 2062 60654).


domingo, 16 de outubro de 2011

A guerra do corpo com a mente - sobre a Maratona de Amsterdam

Ao deixar o tatame depois de conquistar a medalha de bronze no Mundial de Judô em Paris, em agosto, Leandro Guilheiro disse aos jornalistas (eu entre eles):

"Tive um dia difícil aqui em Paris, que é um lugar onde gosto muito de lutar. Não sei o que aconteceu. Dei cabeçada, arranhei o rosto, o peito, os dedos... Mas mostrei força mental e coração. Mesmo quando o judô me abandona, é bom saber que ainda tem o resto".

Essa foi mais ou menos a história da minha Maratona de Amsterdam. Preparem-se, pois esse post não vai ter o final feliz que eu queria contar.

Foram 24h de luta entre corpo e mente. Na noite da véspera da prova, a cabeça não descansava por nada, pedindo ao corpo, por favor, para não decepcionar na corrida. Eu tinha certeza que era possível atingir a meta de correr os 42,195km em menos de quatro horas. Bastava o corpo não vacilar.

Ana Paula Alfano, uma das melhores corredoras-jornalistas de que se tem notícia, comentou o post anterior com muita propriedade: "Sabemos que os treinos são mais difíceis do que a Maratona. A diferença está na cabeça".

E foi ela, a cuca, a responsável pela prova-pesadelo desse domingo em Amsterdam.

Fiz o dever de casa todo: roupa separada no dia anterior, muita água no corpo, café da manhã levinho, aquele pipi providencial antes da largada, vaselina nas áreas de atrito do corpo (não tive nenhuma assadura pela primeira vez, uhu!)... Tudo lindo numa manhã fria (estava coisa de 5-8 graus na largada) com sol prometendo o clima ideal para correr.

Larguei bem - até mais forte do que deveria ter largado. Mas me sentia totalmente segura e dona da prova. Bolei rapidamente a estratégia: ia diminuir o pace depois dos 10km (passei com 55min), levar em banho maria até o 30 e ver se conseguia tirar algum coelho da cartola até a linha de chegada. Aí era só partir para a Heinecken gelada.

Mas pifei. Na altura do km 12 (sim, cedinho na prova) a cabeça queria estar longe daquela rua cheia de gente. O corpo assumiu o controle: "Vamos até o final, sua louca. Nem inventa de desistir".

Sei lá o que houve. O ponto de hidratação tarde demais (foi só no 12)? O engarrafamento para pegar água? O ritmo forçado no começo? Os treinos em exesso? Os treinos de menos?

Acontece que não estava feliz ali. Não curti a paisagem. Não tirei foto (sou fanfarrona, tiro foto quando corro). Não sorri para os holandeses que entoavam "Brasil lara lara lara larááá" ao verem minha camisa. Queria botar o pé na frente de toda moça de cor de rosa ou criatura destrambelhada que me ultrapassava - e foram muitas das duas espécies. Me arrastei por 30 intermináveis e doloridos quilômetros. Foi a pior prova de qualquer coisa que já fiz na minha vida. E não digo só por causa do tempo de 4h21 (o mesmo da minha primeira Maratona, no Rio, ano passado), mas pelo conjunto da obra. Se eu tivesse corrido Rio e Atenas juntas não teria terminado com esse gosto de cabo de guarda-chuva na boca.

"Quem faz muita Maratona é assim mesmo, Manu. Tem as melhores e tem as piores", falou com sabedoria outro craque da imprensa-corredora, Zé Lucio Cardim, testemunha ocular da história na Holanda.

Um dia sei que vou olhar com carinho para a medalha e lembrar da coragem que precisei para resistir por 30km a uma sensação horrível emocional e fisicamente. Vou curtir ter completado minha terceira Maratona. Vou ter orgulho de, apesar de todos os problemas de saúde que enfrentei e enfrento esse ano, ainda sou forte para chegar onde meu corpo me levar. Queira a cabeça ou não.

Como diz Raul (afinal, Amsterdam é a capital dos doidões, né?):

"Veja! / Não diga que a canção está perdida / Tenha fé em Deus, tenha fé na vida / Tente outra vez!
Tente! / Levante sua mão sedenta e recomece a andar / Não pense que a cabeça aguenta se vc parar!"



PS: Sabia que essa história de ficar no último andar do hotel, sem elevador, ia custar caro. Como é que vou DESCER 70 degraus com mala amanhã, raios? Nossa Senhora dos Maratonistas, por favor me ajude!

sábado, 15 de outubro de 2011

Os nossos japoneses são mais caros que os outros

Antes de embarcar para Amsterdam fui ao I Piati, um japonês quebra-galho do lado de casa. Nunca levei a sério um lugar especializado em cozinha italiana e japonesa ao mesmo tempo, mas isso nem vem ao caso. Fui de rodízio, essa instituição da gula brasileira (detalhe que, grosseiramente, no I Piati a comilança não inclui shimeji, que pobreza!), uma Heinecken, uma água e, claro, paguei os 10%, apesar de o garçom ter sido completamente desleixado e terem começado a lavar o chão do salão com a gente lá. Conclusão: R$ 85 no cartão de crédito.

Pesquisando as possibilidades gastronômicas de Amsterdam me deparei com cinco restaurantes estrelados pelo Guia Michelin. O que mais me chamou atenção foi o Yamazato, o único japa da Europa (e um dos raros fora do Japão) com estrela. Reservei.

Sushis do chef A. Oshima, do Yamazoto (Foto do site Yamazato.nl)
Fui recebida por duas mocinhas sorridentes vestidas de quimono e coque: "Welcome, Ms Penna!" e foram logo puxando a cadeira de uma das mesinhas com vista para o jardim japonês e o lago de carpas. Olhando em volta, só vi funcionários orientais, do sushimen aos garçons. Não falam sequer holandês, é japonês ou inglês. Arigatô.

Ao lado do vasinho de flor sobre a mesa, discretamente, um aviso proibia o uso de telefones celulares - civilizadíssimo!

Pedi um chardonnay Sul-Africano (Rietvalley) para acompanhar e, dois minutos depois, lá vem a "gueisha" com a garrafa na mão para me servir não sem antes pedir um "Sorry for making you wait". E foi assim, pedindo desculpas por qualquer 30 segundos de espera, que seguiu o atendimento extremamente prestativo, bem treinado e eficiente.

Eram cinco cursos do almoço: ZENSAI (as entradinhas de atum com rabanete, cavala com cebolinha e frango com figo empanado, este último divino!), TSUKURI (os sashimis - atum, peixe branco e camarão adociado. O atum parecia com colorante de tão vermelho - lindo! - mas o camarão foi a estrela desse prato com sua vinagrete de miso), o prato principal: GUY FILLET KINOKO SANSHO-YAK (traduzindo: um filé tão macio que eu cortava com o hashi com molho de cogumelos - shimeji em abundância! - e pimenta, além de uma saladinha de chicória, tomate e gergelim), NIGIRI SUSHI NOPPEI JIRO (sushis de atum, salmão, ova de salmão, omelete - argh! - e uma sopa meio fruto do cruzamento de canja com misoshiro, um caldo com pedaços de frango, shitake e legumes. Maravilhoso, por sinal) e, por fim, o WAFU DESSERT (sorvete de chá verde com berries e uma mussezinha que confesso não descobri do que era).

"Your bill, Ms Penna, hope you had a nice meal", disse a japinha ao deixar a conta na mesa.

Quer saber quanto eu paguei? O equivalente a R$ 130.

Faz sentido isso? O melhor japonês da Europa, um dos melhores do mundo, custar R$ 40 mais do que um japa mediano (sou educada) no Rio?

Comer: Yamazato (+31 20 6787 450 / yamazato@okura.nl / Ferdinand Bolstraat 333, Amsterdam)

"The journey is the destination"


Ando numa tensão pré maratona tão grande que nem eu me aguento. Cruzes. Maratonista é bicho muito chato: assusto com qualquer dorzinha na perna, na garganta ou nas costas; não aluguei bike em Amsterdam pq não quero correr o risco de cair; já maldisse a dona do hotel que me botou no quarto andar com escadas super íngremes (70 degraus - eu contei) e faz três dias que pareço um bichinho - só como, durmo e bebo água (tá, e água que passarinho não bebe também). Tudo em respeito ao mítico número 42 (e eu acho que essa história de americano dizer que Maratona tem 26 milhas muito melhor psicologicamente, não acham?).

Amsterdam, amanhã, vai ser minha terceira Maratona. As duas outras foram em 2010: nas praias do Rio de Janeiro em 4h21 e nas ladeiras de Atenas em 4h08. 

Nunca treinei tanto para uma Maratona. A ponto de achar até que vou ficar cansada no meio dos 42,195km. Fiz os melhores tempos em treinos, completei duas Meias Maratonas abaixo de 2h nos últimos dois meses e encasquetei com a meta de concluir a Maratona de Amsterdam em menos de 4h. Os dias estão lindos aqui. Sol, temperatura em torno de 15 graus, largada às 9:30, percurso plano... Tudo perfeito. E com direito a comentário de um amigo meu que entende do riscado: "Atenas em 4h08 é prerrogativa pra sub 4h em Amsterdam!!!". Assim mesmo, com três pontos de exclamação. Virou obrigação.

Resultado: Coloquei uma pressão descomunal nas minhas costas. De-tes-to não cumprir as metas que estabeleço pra mim. E agora?

Tô dormindo mal, tô com medo de atrasar pra largada por causa do metrô, tô pensando em cada cm do percurso (tudo bem que eu sempre vejo o mesmo número no Garmin quando fecho os olhos: 3h57, espero que seja um sinal), e tô suando frio. Aí lembro da pneumonia que me nocauteou de março a maio, das minhas viagens, dos vinhos, do trabalho, dos meus treinos minimalistas e tento me acalmar: "P*&%$, Manoela, vc não é super mulher. Relaxa. Vai curtir a prova".

Até que hoje de tarde, caminhando depois do almoço pelos canais ensolarados da cidade, lembrei de uma frase de um adesivo da revista Go Outside que dizia: "The journey is the destination". Caiu como uma luva. O que importa é cada passo até a linha de chegada e não chegar em si. Vou lembrar disso amanhã se Deus quiser. Mas que eu quero baixar de 4h, eu quero.

Correr: Maratona de Amsterdam - largada no Estádio Olímpico às 9:30 (5:30 de Brasília). Meu número é o 4569. Quem quiser pode baixar aplicativo do iPhone aqui para acompanhar. O site oficial da prova está anunciando transmissão de vídeo ao vivo, é só clicar aqui. Dêem algum jeito, mas torçam por mim!