Tirei essa foto em 2004, logo depois das Olimpíadas de Atenas, durante um Troféu Brasil em São Paulo no qual competimos, digamos, juntas. Fabiana Beltrame havia acabado de entrar para a história como primeira remadora do Brasil a participar da regata Olímpica. Sim, participar simplesmente. Sem grandes pretensões. A maior conquista já era estar alinhada ali na raia de Schinias ao lado das maiores do mundo.
Fabi tinha o famoso "peso merda", excuse my French. Era pesada demais para remar com as peso-leve (até 59kg) e leve de mais para encarar as brutamontes da Alemanha, Bielorrússia e Romênia, apenas para citar três singelos exemplares da raça.
Quase duas horas de carro só pra ver Fabiana e cia remarem em Schinias, a raia com mais vento da história Olímpica! |
Fabi e Macarrão na área dos atletas na Grécia. O que eu estava fazendo lá... hehehe não espalhem! |
Mesmo nos Pans de 2003 e 2007 achei que fosse ver Fabi abocanhar a primeira medalha do remo feminino na competição (Guadalajara 2011 que aguarde!). Nada feito. E Fabi foi somando, em seus treinos diários na Lagoa, quilometragem suficiente para dar várias voltas ao mundo.
Casou com o Gibran, teve a pequena Alice e hoje vive com os dois em seu País das Maravilhas. Construiu com muita dedicação, insistência, coragem, sensibilidade e, claro, talento, o caminho até a primeira medalha de ouro do Brasil em um Campeonato Mundial de Remo. Remou por águas bastante maroladas durante os quase 20 anos de calos nas mãos - mudou de cidade, de clube, de categoria, de técnico. Mas, como boa remadora, soube esperar o "sudoeste" parar de soprar para botar o barco n'agua. E cruzar a linha de chegada em primeiro.
Me afastei do remo por uma série de motivos nos últimos anos. Do trabalho como assessora de imprensa da modalidade e da vida de (quase) atleta que nunca consegui levar adiante por causa da minha não-rotina caótica. Mas nunca deixei de prestar atenção nas remadas da Fabi. Não preciso dizer o quanto fiquei emocionada ao vê-la com o ouro em volta do pescoço e o buquê de hortênsias na mão lá longe na Eslovênia. É prova não Olímpica. Sim, e daí? A alemã campeã do mundo estava alinhada ali do lado. A canadense e a americana (rivais no Pan de Guadalajara?) também não deram conta da força e determinação de Fabi na competição. E basta. Como diz Ronaldo de Carvalho, é para encher a boca e dizer CAMPEÃ MUNDIAL. Assim mesmo, em maiúsculo. Ninguém nunca antes na história desse país conseguiu nada igual.
Li um bocado de textos "oficiais" e um tanto "formais" sobre Fabi, Alice e a medalha de ouro em Bled. Mas ainda queria saber mais do que estava na cabeça dela depois desse feito. Sabia que ela tinha o que dizer.
Graças a uma pequena retomada de trabalho junto à CBR, tive a oportunidade de fazer a breve entrevista "de remadora para remadora" com Fabiana Beltrame que reproduzo aí embaixo. As respostas seguras e maduras mostram que a linha de chegada está ali adiante no horizonte. E ela sabe muito bem como remar para chegar lá antes de todas as outras magricelas que aparecerem em seu caminho:
Fabi, Alice, o ouro e as hortências. Foto do site da FISA. |
EU: Como é ser a melhor do mundo?
FABI: É um sonho. Pra ser sincera, não imaginava que podia chegar lá. Mesmo treinando muito pra isso, parecia uma coisa muito distante. Quando vejo as imagens da competição, ainda me emociono.
EU: Quando, durante o Mundial, vc viu que o ouro seria seu?
FABI: Só tive certeza quando cruzei a linha de chegada. Mesmo estando bem na frente, sempre fica aquela sensação que elas poderiam me alcançar a qualquer momento. As vezes olhava pra trás pra ter certeza que estava mesmo na frente, custei a acreditar.
EU: Vc acha que os outros países agora te olham diferente? Enxergam o Brasil como um país diferente?
FABI: Com absoluta certeza. Dá pra sentir o respeito de todos. Remadoras que tenho como ídolas vieram me dar os parabéns e eu sentia que era sincero.
EU: O que vc acha que essa medalha significa para o remo brasileiro?
FABI: Espero que seja uma porta que se abriu, assim como a medalha do Aílson no Mundial sub23, abriu uma porta para mim. Foi a partir da conquista dele que percebi que era possível chegar lá. Espero que outros remadores também se inspirem nisso e nosso remo entre no cenário mundial de uma vez por todas.
EU: Como foi o “dia seguinte” da medalha: ouviu música? passeou com a família? Comeu o que (magrinho é sempre guloso... rs).
FABI: Foi maravilhoso, com a sensação de dever cumprido. Demos uma volta ao lago Bled, que é maravilhoso, tirando fotos, recebendo os parabéns de muitas pessoas e é claro, comendo muita coisa gostosa, rs...
EU: Até onde a Fabiana Beltrame pode chegar?
FABI: Hoje eu já acredito numa medalha Olímpica, sei que não é fácil, é o objetivo de todos os atletas, mas se elas conseguem, nós também conseguimos. Somos todos de carne e osso, o que nos diferencia é a cabeça e o trabalho duro. Sei que pra Londres é difícil, mas com um bom planejamento, por que não em 2016 competindo em casa?
EU: Ser indicada pela FISA para o prêmio de melhor da temporada vale tanto quanto uma medalha? Como vc se sente?
FABI: Nossa, fiquei muito animada com a indicação, mas nada vai superar a emoção que senti quando venci a prova e recebi a medalha com minha filha no colo, cantando o hino nacional. Mas acho que se eu ganhar, vai ser mais uma oportunidade de mostrar para o mundo que nós existimos.
Para votar em Fabiana Beltrame para melhor remadora de 2011 no prêmio da Federação Internacional de Remo é só clicar aqui.
Texto mil e entrevista de coração pra coração. Adorei! Já votei na Fabi!
ResponderExcluirParabéns a Fabiana pelo grande feito, como também pela humildade de reconhecer que o resultado de Aílson a fez acreditar em sua chance de medalha. Espero que, agora, Aílson a tenha como exemplo de determinação e de consciência que existe um longo caminho pela frente. Fernando.
ResponderExcluirA Fabiana merece muito mais. Além dessa parte dourada que a gente conhece lá, pendurada no peito, ela é uma pessoa ótima de se conviver no clube, sem atitudes de estrelismo. Sabe onde quer chegar e não precisa fazer firulas. Treina compenetrada no objetivo e não na imagem.E haja coragem de deixar todas as manhãs a Alice ali, de bracinhos estendidos pedindo pra mãe não deixá-la. Onde ela pode chegar? Não importa. Ela já está lá! Parabéns mil vezes!
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