quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Cinqueterre de todos os ângulos


Manarola vista do hotel à noite.
Era ano 2000. Meu pai havia me dado férias na Itália depois de um GP de Formula 1 em Milão que ele tinha ido a trabalho (me levando a tiracolo). Mochila nas costas e o Guia Visual da Folha na mão, peguei um trem sozinha para sassaricar por Florença, Roma e litoral noroeste da ‘Bota’. Na varanda do albergue em Gênova, buscava frenética um novo lugar para visitar pois não estava me sentindo nem um pouco à vontade na cidade que viu zarpar grandes navegadores. Ao meu lado, um australiano, duas canadenses, uma japonesa que tocava violino na Universidade de Strasburgo e um texano. No dia seguinte, estávamos todos percorrendo, num astral que até hoje me arrepia e traz boas lembranças, as cinco cidadezinhas que colorem os penhascos ao sul de Gênova. Foi minha primeira e mágica experiência em Cinqueterre.

Ano passado, enfim, realizei meu desejo de voltar lá. Dessa vez com pessoas que amo para comemorar meus 35 anos:  meus dois Pedros (o marido e o meu melhor amigo – este com a namorada) e meu irmão com a namorada.

Uma chuva, em outubro de 2011, devastou Vernazza e parte das trilhas e estradas. Um esforço da população reconstruiu parte do comércio e restaurantes (sobretudo em Monterosso e Vernazza) e não deixou abalar a autoestima dos habitantes, que vivem do turismo, naturalmente.

Pesquisa dali e daqui, encontrei um hotelzinho em Manarola cheio de charme: o La Torreta. São algo como cinco apartamentos que se derramam sobre a encosta. Vista sem igual. Atendimento acolhedor. É caro. Mas é especial.

A primeira grande dica para quem for a Cinqueterre: não fique nas cidades “das pontas” – Riomaggiore e Monterosso. Elas são mais acessíveis (por carro e trem), mais turísticas (muitos grupos e serviços impessoais), mais “americanizadas”. Ficamos uma noite em Manarola e abrimos mão da hospedagem em Vernazza na segunda noite (seria a Affitacamere Tonino Basso. Não fique lá de jeito nenhum!!!!) e acabamos, infelizmente, parando num hotelzinho na beira da estrada (acolhedor, mas sem estilo) chamado Due Gemelli – bom, bonito e barato, que não era bem o que queríamos para a noite do meu aniversário. Mas não deixa de ser uma alternativa econômica e eficiente. E com um ótimo café da manhã!

Dá para fazer um “bate-volta” e percorrer as cinco cidades a partir de Gênova,  Pisa ou La Spezia, sobretudo se for mesclar os meios de transporte, usando trem, barco e caminhada. Para dormir em Cinqueterre, opte, na ordem, por pernoitar em Manarola, Corniglia e Vernazza. E nem pense em ir sem reservar.

Partimos no primeiro dia para fazer a trilha de Manarola a Vernazza, passando por Corniglia. Antes de iniciar a caminhada, é preciso comprar o “Cinqueterre Card”, um passe de um ou dois dias que dá direito a acessar as vias do Parque. Compre mesmo, pois é checado!

Devido à chuva, o caminho mais plano entre Manarola e Corniglia estava fechado e a opção foi subir até a cidade de Volastra para depois descer, o que torna o caminho tão mais duro quanto deslumbrante.

Início da subida em direção a Volastra.
Levamos quase quatro horas para fazer tudo, parando para tomar cerveja, colher figos e uvas do pé, contemplar o visual, tirar fotos e respirar. Hoje, eu não teria ido direto a Vernazza, teria parado em Corniglia e, quem sabe, pegado trem ou barco para Vernazza.

Do alto em sentido horário: trilha entre mar e vinhedos; Corniglia vista do mar; chegada em Vernazza, Manarola e porto de Manarola; Praia de Monterosso.
A caminhada não exige preparo de atleta, mas é preciso disposição e alguma logística: levar chapéu, protetor, água, lanche. Não tem nada para comprar no caminho. O percurso é bem marcado e, como a região possui diversos roteiros, marcas coloridas indicam a qual ele pertence como acontece nos melhores destinos de trekking do mundo. O mapa que vc ganha ao comprar o “Cinqueterre Card” é claríssimo e ajuda muito.


Quando fui da primeira vez, emendei de um tiro só de Riomaggiore a Monterosso, saindo de manhã cedo e terminando já com o céu escuro. É possível, mas não faria isso de novo. Sentar nas mesinhas à beira mar para comer mariscos e peixes frescos, mergulhas, beber um vinho branco produzido ali mesmo é simplesmente espetacular.

No dia seguinte, preguiçosos, fomos até Riomaggiore para cumprir uma etapa obrigatória: passar pela Via Del’Amore e deixar um cadeado em uma de suas grades.


São 20 minutos a pé, em asfalto polvilhado por jovens casais, grupos de idosos, mochileiros e toda a sorte de gente. Como era justamente 16 de setembro, paramos em uma birosquinha debruçada sobre o mar para abri um espumante e brindar meus 35 anos. Valeu à pena.

Essa última noite dormimos em Monteroso num hotel feito para americanos velhos (sem preconceito, apenas para vcs entenderem o estereótipo do Porto Rocca). O pernoite, em si, foi bola foraça. Mas o programa foi demais: piquenique na marina com vinhos, queijos e amigos especiais. No mar calminho, um jogo de pólo aquático entre Monterosso e Vernazza lembrava um ano da enchente que castigou a região.

Para mergulhar, gostamos muito de Vernazza. Um porto abrigado com vida marinha e tudo (Nedja, minha amiga, pisou em um polvo e tudo!). Manarola também pareceu simpático para um banho. Não descemos até a praia em Corniglia, mas parecia ser bom também. Monterosso tem um estilo esquisito: vc paga para usar o espaço (a menos que tenha a pulseirinha do hotel de velho que ficamos). Sei lá... não gostei. Para aproveitar o dia ‘al mare’, alugamos um caiaque em Monterosso e remamos até Vernazza, com direito a vários tibuns pelo caminho. Era o que eu queria.

Remada...
... e mergulho!
Comer come-se muito bem. Tivemos alguns momentos memoráveis. A começar pela primeira noite em Manarola, com a mesa farta e fresca da Trattoria dal Billy (tem que reservar). Fomos no misto de antipastos sugerido pelo garçom (anchovas salgada e ao limão sensacionais!), emendamos com três pratos de massa para dividir (trofie al pesto, vôngoles e tudo o mais) e fechamos com um peixe simples, lindo, enorme e gostoso com batatas. Vinho branco da região bem fresco na taça e eu não podia pedir nada além disso.

Vinhos locais.
No segundo dia comemos em Manarola também, em um restaurante bem perto do porto chamado Il Porticciolo. Outra experiênica bacana, mas sem grandes emoções (embora o pesto estivesse melhor que o do Billy). A vista, porém, é um tempero à parte.

O ‘gran finale’, sem dúvida, foi o almoço do meu aniversário no mágico Belforte. Um carramanchão de sapê em cima de um penhasco com vista 360 graus de Vernazza. Gaivotas voando. E mais peixes e mariscos recém-saídos do mediterrâneo. A gentileza da equipe de atendimento chegou a ser comovente. Ao entenderem que era meu aniversário, recebi uma singela flor branca. Ao final, dois garçons dos quais não recordo o nome trouxeram uma rodada de lemoncello como cortesia e brindaram conosco (eles com duas taças de prosecco).

Belforte.
Para quem for de carro (nós estávamos motorizados pois íamos da Toscana para Nice), tem que ficar esperto para estacionamento (caro e longe). Não são cidades para visitar de carro, como imaginam. Você não usa ele para literalmente nada. As estradas asfaltadas são muito sinuosas e estreitas. Em alguns momentos chegam a ser assustadoras, como quando fomos de Vernazza para Monterosso. Opte por circular de trem ou barco.

Uma rara vista da janela do trem. A estrada de ferro passa toda por túneis.
Mas é rápido e baratíssimo.
Aliás, uma saída bacana, como nos sugeriu Mattia, no La Torreta, é caminhar de Manarola a Monterosso ou Corniglia num tiro só saindo cedo de manhã e retornar de barco (tem uns ferrys baratíssimos a cada hora ligando todas as cidades) até Riomaggiore. Daí faz-se, em 20min, a Via Del’Amore para retonar ao ponto de partida (Manarola).

Comer: Todas as cidades têm muitos restaurantes e biroscas. Pizzas al taglio, pratos de peixe, massas incríveis. Divirta-se. Os meus favoritos eu listei acima. Se vc conhecer outros e aprovar, deixe um comentário com a dica aqui no post!

Correr: Há diversas trilhas por todo o Parque de Cinqueterre. Nos hotéis e estações de trem, é possível se informar sobre os roteiros. O mapa (gratuito) é ótimo. Há caminhos mais rente ao mar e outros que sobem bastante. Programe-se para não ser pego de noite no meio da trilha. E não deixe de comprar o Cinqueterre Card.

Remar: Aluguel de caiaques eu vi em Vernazza e Monterosso. Com o mar calmo, é Possível se divertir demais. Cuidado com o vendo na hora de calcular a volta. Remar entre Vernazza e Monterosso leva cerca de 1h.

Atenção, atenção: checar antes de ir se as vias de caminhada (sentieri) estão abertas pois, devido a queda de pedras e chuvas, todo o trajeto tradicional estava chiuso recentemente.

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